Em evento paralelo à Rio+20, lideranças indígenas de todo o País se juntam para reivindicar respeito aosacampamento indigena seus direitos e denunciar descumprimento de leis. Este é o momento oportuno para chamar atenção a uma causa quase invisível no país. 

 

Pela primeira vez, o Acampamento Terra Livre troca o palco do anúncio de suas reivindicações. Sai de Brasília rumo ao Rio de Janeiro para denunciar às autoridades que participam da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, entre os dias 13 e 22 de junho, as violações aos seus direitos. Momento oportuno para chamar atenção a uma causa quase invisível no país, já que durante os próximos dias os olhares do mundo estarão voltados para a capital carioca.

“Era importante trazer o acampamento para a Cúpula dos Povos, na Rio+20. É um evento mundial, e um momento muito oportuno para os povos indígenas mostrarem a cara e dizerem o que está acontecendo no Brasil”, destaca Sonia Guajajara, vice-coordenadora das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e integrante da direção nacional da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

Entre as denúncias listadas estão os inúmeros empreendimentos em andamento e planejamento no País que afetam terras indígenas; o descumprimento da Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que manda fazer consultas prévias e informadas aos indígenas em caso de obras que impactam suas terras; o Código Florestal, recém “emendado” pela Presidente Dilma Rousseff; a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, em discussão no Congresso, que reorienta o processo de demarcação de Terras Indígenas.

“Tudo isso causa um impacto grande na vida dos povos indígenas. Então, nós viemos para cá para dar visibilidade às nossas lutas e para mostrar que este modelo de desenvolvimento que está sendo discutido não é bom e não corresponde com a nossa realidade. Nós vemos o desenvolvimento de outra forma: que reconheça os direitos, que reconheça a vida social, que não desaloje as pessoas. Nós queremos mostrar ao mundo o que é ser realmente sustentável. Porque ninguém melhor que os povos indígenas para dizer o que é sustentabilidade”, completa.

O Acampamento Terra Livre foi aberto nesta quinta-feira (15), no Aterro do Flamengo, junto com as demais atividades propostas na Cúpula dos Povos, evento paralelo à Rio+20, proposto pela sociedade civil para discutir os principais problemas enfrentados pela humanidade. A expectativa é que 1,5 mil indígenas do Brasil e de países da América Latina se juntem nas discussões para formatar um documento que será entregue à Organização das Nações Unidas (ONU) e aos chefes de Estado durante a conferência oficial, realizada no Riocentro, entre os dias 20 e 22 de junho. Até agora, 500 indígenas chegaram ao acampamento.

Para Winti Kisêdjê, presidente da Associação Terra Indígena Xingu (Atix), ver a participação de vários povos fortalece a pauta e dá visibilidade à questão indígena. “Nosso foco de reivindicação são as hidrelétricas que estão sendo feitas, porque isso não é bom e a gente não quer que seja construída, e a questão das nossas terras. É importante ver gente de todas as regiões para mostrar nossa luta. Para as pessoas conhecerem a gente e verem que cada povo está se organizando para lutar contra as coisas que acabam prejudicando nosso povo”, diz.

Mais que um aglomerado de gente, Jurandir Siridiwe Xavante, cacique da aldeia Etenheritipá, em Mato Grosso, lembra que é preciso a construção de uma pauta forte, conjunta, para apresentar aos líderes mundiais. “Temos que mostrar para os homens do negócio, que estão aí na Cúpula, e na conferência oficial, que nós temos o que dizer. Mostrar para eles, que estão no Brasil fazendo negócio, que praticamente o que sobrou de área verde está nas Terras Indígenas, nas Áreas Protegidas. Então, não podemos deixar que o desenvolvimento dessa forma que está hoje avance. Temos que mostrar que estamos ameaçados por esse progresso”, diz.

Violência invisível

De acordo com os dados divulgados no último relatório “Violência contra os Povos Indígenas do Brasil”, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), em 2011 foram registrados 51 assassinatos de indígenas. Desses, 32 eram de Mato Grosso do Sul.

O documento registrou ainda que o número de casos na Bahia também aumentou, com o assassinato de cinco índios pataxó. Coincidência ou não, os casos cresceram bem no ano que os índios reforçaram a luta por suas terras e o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou o julgamento iniciado pela Funai há mais de 30 anos e que só foi finalizado em maio deste ano, a favor dos índios (saiba mais - http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3539).

“Desde Marçal de Souza ninguém foi preso. Precisamos resolver a demarcação, pois com isso, resolvemos tudo. Por isso é importante estarmos aqui e obrigar o governo a tratar dessas questões”, aponta Otoniel Ricardo Guarani Nhandeva, da coordenação da Apib e membro da Aty Guasu, o conselho guarani.

Marçal de Souza foi um grande líder guarani nhandeva assassinado em 1983, em Mato Grosso do Sul. Desde o início dos anos 1970 denunciava a expropriação de Terras Indígenas, a exploração ilegal de madeira, a escravização de índios e o tráfico de meninas índias. Foi perseguido, sofreu ameaças e muitas agressões, até que foi morto a tiros em sua casa e os acusados do crime foram absolvidos num julgamento realizado apenas 10 anos depois.

Por Christiane Peres

Fonte: ISA